Os diálogos longos são a grande marca do longa de Casey Affleck
Lembra quando você era criança e, pouco antes de dormir, seu pai ou sua mãe se deitava a seu lado e lhe contava uma história? Às vezes, cansado(a), você adormecia antes de ouvir o final; às vezes, com menos sono ou mais interessado(a), você perguntava: “Como termina a história?”, e escutava em resposta: “Amanhã eu conto”. A Luz no Fim do Mundo lembra esses momentos, quando eram somente você e seu pai, ou somente você e sua mãe.
O contexto do longa – que tem roteiro e direção de Casey Affleck -, porém, é mais triste e menos nostálgico. O cenário dessa história é o mundo pós-apocalítico onde uma epidemia devastou a população feminina da face da Terra. Imune à doença, Rag (Anna Pniowsky) se torna a única sobrevivente de seu gênero. Desde então, seu pai, interpretado pelo próprio Affleck (que não tem nome no filme), a protege, fazendo-a parecer um garoto – ela veste sempre calça, bota e um casaco com capuz, ou boné – e nunca ficando no mesmo lugar por muito tempo.
Assim, sempre em movimento, a única coisa que os dois têm a fazer, é conversar. E eles conversam, conversam, conversam e conversam; ora dentro de sua barraca de acampamento, enrolados em seus sacos de dormir, ora andando pela floresta, ora dentro de uma casa afastada que eventualmente encontram vazia.
Porque é disso que se trata A Luz no Fim do Mundo: diálogo. Um diálogo entre pai e filha. Um diálogo construído muito em cima das histórias que Papai (Affleck) usa para criar e formar Rag. É este o ponto mais bonito da trama. Um homem se esforçando ao máximo para criar a filha e fazer dela a mulher que ela deveria se tornar sem confundir sua cabeça, já que ao mesmo tempo ela tem que fingir ser um garoto para manter-se a salvo no lugar violento que o mundo se tornara devido à ausência do feminino.
Ainda, essa relação de apenas dois se reforça pelo cenário – que em boa parte do filme é mais fechado, principalmente quando falamos da barraca de acampamento de Papai e Rag, com a câmera filmando de cima –; pelo fato de algumas colônias de outras mulheres sobreviventes serem mencionadas sem, todavia, jamais aparecerem; e também pela voz de Affleck, sempre mais baixa e cadenciada (a não ser em momentos de exasperação), buscando sempre explicar sobre o mundo e a vida para a filha.
Essa mesma voz que, no entanto, poderia ter tornado o filme tão monótono que ele se transformaria em um poderoso sonífero. Não que sua atuação seja ruim, mas é a brilhante atuação de Pniowsky que salva A Luz no Fim do Mundo, carregando-o nas costas com seu carisma e presença de cena e impedindo que essa transformação se realizasse.
Na verdade, Affleck consegue inserir, dentro de um drama bem forte que beira à depressão, uma sensibilidade que só se pode dizer rara num mundo tão caótico e desestruturado.
E assim, com as andanças de duas pessoas meio desesperançadas por este mesmo mundo, o longa começa e termina. Não há um ápice, aquele momento glorioso que justifica toda a história. A Luz no Fim do Mundo é uma linha reta que leva a uma conclusão esperada desde o início, a única mentira que Papai contou para a filha na vida: o de que um dia, ele não estaria mais ali, e de que ela teria que se virar sozinha. Como seria então? Ninguém sabe… nem o final da história.