Quando Eu Me Encontrar é um filme brasileiro de 2023 que percorre a vida de diversos personagens que têm suas vidas mudadas a partir do momento em que Dayane sai de casa sem avisar para onde vai. A sensibilidade e a localização realista fazem desse filme um excelente demonstrativo do que o cinema do Ceará pode produzir para o Brasil.
O filme, roteirizado e dirigido pela dupla Michelline Helena e Amanda Pontes, apresenta uma interessante dinâmica que perpassa a vida de várias pessoas próximas a uma mulher chamada Dayane. Quem é ela? Não sabemos, porém conhecemos todas as outras personagens e o que a ausência dela causa.
Aí está o grande ponto positivo da narrativa do filme: nós só conhecemos as personagens por causa do sumiço de Dayane. Conhecemos profundamente seu noivo, Antônio (David Santos), sua melhor amiga (Di Ferreira), sua irmã Mari (Pipa) e sua mãe (Luciana Souza, a Isa de Bacurau).
Ao longo do tempo, a falta que Dayane faz justifica o título do filme, não só porque fica subentendido que ela largou sua vida aparentemente estável para se encontrar. As outras pessoas também acabam se encontrando nesse processo: sua irmã na relação com seus colegas de escola, sua mãe com a família e o trabalho, e seu noivo refletindo sobre a própria vida.
Quem leu minha última crítica sabe que o que mais me incomodou em Meu Casulo de Drywall foi a desconexão que o cenário e as situações do filme podem causar em quem assiste. Em Quando Eu Me Encontrar, isso teria potencial para ocorrer, mas novamente o cuidado com a cinematografia ajuda.
Como expoente do cinema cearense (que já trouxe pérolas como Cine Holliúdy, de Halder Gomes), o filme está muito conectado à realidade daquele estado, mais especificamente de Fortaleza. Isso, para mim, mero sudestino que nunca visitou a “Terra da Luz”, poderia ser confuso. Porém, o que as diretoras fazem de forma magistral é incluir elementos muito comuns à realidade brasileira que outros filmes guardam certos pudores ao retratar. É possível ver WhatsApp (com figurinhas engraçadas), colégios comuns, vendinhas de esquina, decoração padrão de casa brasileira e até greve de ônibus!
Todo esse carinho faz uma história tocante de um filme que teoricamente, não iria a lugar nenhum, uma vez que Dayane não aparece e ninguém consegue encontrá-la (na verdade, ninguém nem sabe por onde começar a procurar). Quando começamos a nos incomodar, o filme termina. Nem sempre terminar rápido é um bom sinal, mas aqui, num piscar de olhos, conseguimos sentir o fim da jornada de todos os envolvidos.
Para algumas pessoas, pode ficar a incômoda sensação de que faltaram melhores detalhes sobre algumas relações entre os personagens e sobre a própria Dayane. Assim que compreendemos que a ausência é protagonista, essas questões certamente não atrapalham significativamente a experiência.
Apesar do aspecto universal dos elementos do filme, o que é regional funciona de forma excelente, quase convidativa. A trilha com artistas locais, como a banda fortalezense de rock Pulso de Marte, e sequências mais longas da aparição de Di Ferreira (que além de cantora na ficção tem uma carreira musical na vida real) enriquecem a obra. As imagens do litoral e do subúrbio da capital cearense merecem destaque por sua ambientação agradável e pacífica.
O elenco, formado em sua maioria por atores locais (a exceção sendo a baiana Luciana Souza), está muito bem, levando com tranquilidade e realismo a situação tensa que um desaparecimento causa nas pessoas próximas. Essa abordagem nos acostuma com essa forma de contar uma história; essa abordagem de atuação não rouba o protagonismo do sumiço (que é a principal personagem) mobilizando a vida de praticamente todos que aparecem. Grande destaque para Pipa, que faz uma excelente adolescente pobre em um colégio particular, empática e introvertida.
Portanto, Quando Eu Me Encontrar é uma experiência muito agradável, mesmo em seus momentos mais tristes, trazendo alento por sua abordagem segura e tranquila. Não é chato; pelo contrário, subverte algumas impressões que o espectador comum tem sobre determinados filmes nacionais sem ação movimentada e/ou humor exagerado. Esse filme merece atenção a cada um dos detalhes que Helena e Pontes trazem para as telas. Mais do que um filme sobre o desaparecimento de alguém, é um filme sobre os movimentos constantes que precisamos fazer para nos encontrar em nossas vidas.