Durante um fim de semana em uma casa de campo luxuosa, Iris (Sophie Thatcher) e Josh (Jack Quaid), um casal apaixonado, decidem se afastar do tumulto da cidade para relaxar com alguns amigos. No entanto, o que começa como uma escapada romântica logo se transforma em um thriller quando eventos perturbadores começam a ocorrer. Se você ainda não conhece Acompanhante Perfeita, quanto menos souber, melhor – para uma experiência verdadeiramente surpreendente, pare a leitura aqui, evite os trailers e volte mais tarde. Este texto contém spoilers.
Embora a Warner tenha feito de tudo para esconder detalhes da trama no teaser, a distribuidora não conseguiu escapar da síndrome de revelar o enredo inteiro no trailer. Infelizmente, já nos entregam a grande reviravolta: Iris é um robô e se encontra presa em um relacionamento de poder. Mas, por incrível que pareça, a falta de surpresa não compromete o filme – tirando esse spoiler do caminho, podemos nos permitir uma análise mais profunda sobre como homens “aparentemente inofensivos” podem ser perigosos. Josh, que se apresenta como um “cara legal”, representa perfeitamente um arquétipo que se disfarçou por um bom tempo. Por trás da sua gentileza, ele testa os limites da parceira e se vitimiza como se o mundo lhe devesse algo, enquanto nunca tomou uma atitude relevante. Esse clichê de “bom moço” que na verdade é um manipulador da pior espécie é um prato cheio para análise – mas não nos enganemos: é um prato frio e bem repetido.
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Acompanhante Perfeita Não é uma história exatamente nova, igual ao antecessor Noites Brutais, que tinha um viés criativo maior no campo do suspense/terror, mas aqui, fica bem óbvio o que vai acontecer depois que a grande revelação é feita. As ações de Iris tornam-se previsíveis, e nos pegamos prevendo cada uma de suas tentativas de escapar da situação em que se meteu. O filme também faz um diálogo interessante com Ruby Sparks: A Garota Perfeita, outra obra que explora o conceito de controle nos relacionamentos. No entanto, aqui, Josh não se preocupa em reconhecer o erro – ele apenas se acomoda em sua própria mediocridade.
Um elemento particularmente perturbador é como o filme expõe a objetificação feminina levada ao extremo literal. A ideia do “fuckbot” causa repulsa e expõe os problemas que envolvem a comercialização de bonecas em tamanho real no mercado adulto. Aqui, a ideia do controle vai além do clichê da “submissão” – o filme nos lembra que, até na tecnologia, o homem adora ser o dono da situação. Para além dessas questões, ainda temos o roubo planejado por Josh, que desencadeia toda a situação, adicionando camadas à sua personalidade manipuladora – ou seja, o cara é um completo desastre, mas se acha o prêmio.
A preguiça de Josh é sintomática: ele nem se deu ao trabalho de criar um cenário romântico original na programação de Iris, simplesmente colando um “meet cute genérico” para forjar a conexão romântica. Os robôs acompanhantes são programados para amar seus usuários incondicionalmente, e Josh precisava exatamente disso – afinal, quem mais amaria alguém tão acomodado? Ele seria incapaz de amar alguém que não se subjugasse a ele. Essa dinâmica não é apenas triste, é um retrato de como muitas pessoas, infelizmente, funcionam na vida real.
Diferente de Ruby Sparks, em que o protagonista eventualmente reconhece o horror de controlar outro ser e permite que sua criação seja livre, Josh representa aquele tipo de homem que prefere destruir o que não pode controlar. Enquanto Ruby consegue sua libertação e humanidade, Iris precisa lutar contra sua própria programação para sobreviver à crueldade de seu criador. Aqui, a reflexão vai além de uma simples crítica à objetificação – é sobre os limites da manipulação e do controle, e sobre o que acontece quando alguém se acha dono do outro.
O fato de Josh não se apresentar como uma ameaça óbvia é justamente o ponto crucial do filme. Até mesmo seu melhor amigo gay demonstra mais respeito por seu parceiro artificial do que Josh jamais demonstraria. E antes que surja o inevitável “nem todo homem”: sim, todo homem é uma potencial ameaça nas circunstâncias “certas” – é exatamente isso que o filme nos força a enxergar. O filme explica por A+B como o ser humano tende a subjugar tudo que toca, seja através da tecnologia ou das relações de poder, transformando até mesmo a inteligência artificial em mais um instrumento de dominação. Ou seja, a verdadeira ameaça não está no robô – está no cara do lado que acha que manda no mundo.