Crítica| Levantando a bandeira feminista, ‘Enola Holmes’ consegue sua emancipação

Depois de passar por um processo envolvendo os direitos autorais da famosa obra de Sir Artur Conan Doyle (que ainda não caiu em domínio público), a equipe de Enola Holmes finalmente viu sua obra ser lançada nessa quarta, (23) na Netflix, contando a história da irmã (até então desconhecida pelo público) do icônico detetive Sherlock Holmes (Henry Cavill).

A personagem título do longa ganha vida na magnífica interpretação de Millie Bobby Brown, cujo talento já é notório desde que a jovem atriz apareceu em Stranger Things, também disponível na Netflix. Baseado no primeiro romance da série de livros de Nancy Springer, The Enola Holmes Mysteries, intitulado O Mistério do Marquês Desaparecido, é em torno dela que gira o enredo do filme.

Assim, tudo começa quando Eudoria (Helena Bonham Carter), mãe de Mycroft (Sam Claflin), Sherlock e Enola, some misteriosamente de sua casa no interior da Inglaterra, deixando a filha de dezesseis anos sob a guarda do irmão mais velho. Tem início então uma busca investigatória muito interessante que pode ser traduzida como uma disputa de inteligência entre Sherlock e Enola, com esta última sempre um passo à frente.

É dessa forma que, desde o início da película, a bandeira do feminismo é levantada – permanecendo erguida até o final de seus 123 minutos de duração -, refletindo-se em vários de seus personagens. O Mycroft de Claflin é apresentado como um machista antipático que, mal conhecendo a irmã caçula e sem saber nada sobre a educação peculiar que Eudoria (feminista declarada) tinha dada à garota, só quer se livrar dela colocando-a numa escola para jovens damas.

Em razão disso, creio que não estaria exagerando se o classificasse como um dos vilões da história. Já o Sherlock de Cavill, longe de ser o detetive egocêntrico e frio que conhecemos, mostra-se empático e sensível, numa subversão sem precedentes do personagem. Foi bonitinho, porém nada condizente com a personalidade do morador mais ilustre da Baker Street, que ficaria totalmente bitolado em encontrar uma mente mais brilhante que a dele (haja vista sua rivalidade e competitividade com Moriarty, o malvado gênio do crime).

Por outro lado, além de ostentar uma fotografia clara, colorida e arejada – o oposto do clima sempre mais sombrio e cinzento (e por que não dizer um pouco pesado) característico das histórias de Sherlock -, Enola Holmes é extremamente divertido. E o motivo disso tem nome: Harry Bradbeer. É fácil perceber a marca do diretor de Fleabag (a fantástica série da Amazon Prime Video) no longa, em especial a característica quebra da quarta parede pela personagem principal.

Assim, do mesmo modo que a premiada Phoebe Waller-Bridge, Millie Bobby Brown também conversa com o espectador e, da mesma forma que aquela, também está fantástica.

Dessa forma, Bradbeer tenta, com sucesso, nos colocar dentro de um jogo de tabuleiro, notadamente do popular Scrabble, e é assim que conseguimos acompanhar Enola em seu progresso para localizar a mãe. No meio do caminho, porém, um encontro inesperado com o marquês Tewkesbury (Louis Partridge) acaba desviando um pouco sua atenção.

Dessarte, entre viagens de trens e carruagens, das belíssimas imagens da Inglaterra, e do figurino versátil de Enola (que vai dos sofisticados vestidos usados pelas damas da alta sociedade até as calças e botas usadas pelos pobres jardineiros) vamos conhecendo essa nova personagem, sua relação com os irmãos e seu interesse por um jovem marquês que é muito mais do que ela pensa.

Antes de terminar, chamo a atenção do leitor para a homenagem que é  feita durante toda a trama do filme aos anagramas. Enola, de trás para frente, se escreve alone, que em português significa “sozinho(a)”. É com esse conhecimento que a mensagem final do filme é passada. Não darei spoilers. Que tal dar uma de detetive e assistir ao filme para descobrir?