Crítica de filme

Crítica | A Jaula

Publicado 3 anos atrás
Nota do(a) autor(a): 2.0

Todo filme é um retrato da época em que foi feito. A Jaula é mais um exemplo disso. Adaptação do longa argentino 4×4 (2019), o filme de João Wainer busca trazer para a realidade brasileira uma história de tensão e terror mesmo que desprovida de sutilezas.

No longa, Chay Suede interpreta Djalma, um ladrão que ao tentar roubar um carro de luxo, acaba ficando preso dentro dele. Depois de várias tentativas desesperadas de escapar, o rapaz descobre ter caído em uma armadilha criada por um rico médico (Alexandre Nero) cansado de sofrer nas mãos de bandidos. Começa aí a luta pela sobrevivência de Djalma dentro deste jogo mortal (trocadilho intencional).

A Jaula seria um bom exemplar de filme de suspense se talvez não quisesse forçar muito uma ou mais mensagens. Os esforços para deixar bem claro que tipo de pessoa é o vilão do longa acabam por enfraquecê-lo e tornar tudo caricato demais. O que é algo a se lamentar, pois tecnicamente, o filme possui certa qualidade, seja no seu jogo de câmera claustrofóbico dentro do veículo ou em algumas das cenas de ação.

Mas, novamente, A Jaula insiste em martelar sua mensagem para o público de quem é o vilão dessa história. Interpretado por Alexandre Nero, seu personagem é praticamente um bingo de uma elite brasileira que conhecemos bem; se declara como “cidadão de bem”, ao ler as notícias do dia chama desmatamento de “fake news” e comenta que a morte de uma criança em uma favela durante ação policial “é algo que acontece”, além de fazer questão de ser chamado de doutor. Nero até se esforça em dar alguma naturalidade para seu personagem, fato dificultado ainda mais por se fazer presente na maior parte do longa através de sua voz, mas os diálogos são um amontoado de clichês de uma elite raivosa.

Mirando ainda em uma crítica à mídia sensacionalista, temos em paralelo à trama principal um programa no estilo dos apresentados por gente como Datena e Sikêra Júnior, que vivem de espetacularizar a violência cotidiana ao mesmo tempo que proferem ódio à minorias. Mesmo que essas histórias acabem por convergir no clímax do filme, a escolha da jornalista Astrid Fontenelle como apresentadora acaba de novo por transformar esse personagem em uma mera caricatura, evidenciado pela falta de traquejo na atuação de jornalista.

Fechando o elenco, Chay Suede logra maior sucesso em sua atuação justamente pelo silêncio. Preso dentro do carro na maior parte do filme, o personagem de Suede é construído basicamente por suas ações e objetos de cena, deixando que o ator fique livre para expressar todo seu desconforto e sofrimento através do seu corpo.

Mesmo pregando para convertidos e ainda assim julgando necessário esfregar na cara de sua audiência suas intenções, A Jaula acaba por ser uma mera caricatura da sociedade brasileira levada ao extremo.

Compartilhar
A Jaula
País: Brasil
Direção: João Wainer
Roteiro: João Cândido Zacharias
Idioma: Português

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *