Crítica de filme

Barbie

Publicado 1 ano atrás
Nota do(a) autor(a): 4,5

É muito difícil medir o impacto cultural da Barbie na sociedade, afinal, são mais de 60 anos de história pra contar, e cá entre nós, é impossível associar a trajetória da boneca com o lançamento da Warner sem criar um TCC de 40 páginas. Então vai ser interessante ver a percepção do público, já que cada pessoa será impactada de uma forma diferente pelo filme. Inclusive, se você está na faculdade, não se surpreenda se o tema “Barbie” aparecer nas próximas bancas de avaliação. Você, aluno pimpão de Publicidade e afins, segura sua onda, tá? Para esta análise não ficar mais desorientada que criança em loja de brinquedo, quero destacar apenas o trabalho de Greta Gerwig, e como ela conseguiu administrar um  projeto que já nasceu com expectativas altas. 

Ela é perfeita, ela tem tudo e faz tudo! Basicamente é assim que começa a história da nossa protagonista no mundo de Barbieland. A Barbie Estereotipada (Margot Robbie) – como ela mesma se declara – vive seus dias na casa dos sonhos criando momentos de diversão com suas amigas Barbies e sendo idolatrada pelo Ken (Ryan Gosling), até que ela começa a ter experiências bizarras e busca ajuda na casa da Barbie Estranha (Kate McKinnon) para ter sua vida de volta. Mas quando ela é obrigada a viajar para o Mundo Real,  o que parecia ser um problema pequeno vira uma jornada de autoconhecimento e reinvenção do seu estilo de vida. 

A trama é revigorante em diversos aspectos, mas pra começar, fiquei muito aliviada por não terem caído na armadilha de criticar o capitalismo de forma pesada. Teve sim uma alfinetada, mas que só agregou ao humor ácido da diretora. Mesmo porque, a Barbie é a prima burguesa do capitalismo, e a Mattel estava em cima da produção. Não daria certo! A história se preocupou muito mais em mexer com o íntimo de toda garota que teve ao menos uma Barbie durante sua vida. Para aquelas que não tiveram esse privilégio, elas conhecem bem a sensação de cobiçar essas bonecas nas prateleiras reluzentes das lojas, e tiveram suas versões genéricas imaginando que fossem ela – inclusive senti falta de uma piadinha sobre isso. Na falta da nave mãe internet, também existiam os comerciais que passavam na TV a torto e a direito para despertar o desejo. No fim do dia, todas nós temos uma ligação com a boneca e representar essa bagagem emocional deve ter assustado a diretora e roteirista. Então o que Greta fez? O que ela faz de melhor, um filme coming of age adorável.

Não adiantava ela sair do tema que já dominava para reinventar a roda narrativa, pois a Barbie em si já é um acontecimento. Uma história mirabolante não cabia, mas sabe onde tinha espaço para excesso? No design de produção, no figurino, na maquiagem e na fotografia, categorias que já podem esperar uma estatueta dourada na próxima temporada do Oscar. A comédia é outro excesso aqui, no melhor sentido da palavra, afinal, estamos falando de brinquedos visitando o mundo humano e vice-versa. Soa familiar? Quem tiver um bom olho vai notar uma semelhança ou duas com Toy Story. E como tem referências nesse filme, viu? Se eu fosse Steve Rogers minha lista formaria um rolo de cinco metros de comprimento, é impossível piscar enquanto você acompanha a aventura da Barbie, seja pra não perder um detalhe no cenário, ou rir de uma piada inteligente. 

Barbie é uma clássica jornada do herói. A protagonista é colocada em um caminho para salvar uma situação, tem seus guias, suas dúvidas, e no fim, supera suas dificuldades e tudo dá certo! A dinâmica do elenco é elétrica e me faltam caracteres para tecer elogios para as performances. Ryan Gosling merece um destaque especial, porque onde esse homem faz comédia ele brilha. Sofre algumas críticas por não ter expressão? Sim, é por isso que ele foi a escolha perfeita para interpretar o Ken. Ele tem a pose de galã vazio, mas tem um timing cômico sem defeitos. Quando entra numa espiral de estereótipos masculinos, as gargalhadas são garantidas! Até me sinto um pouco mal pela Margot… Não é que ela decepciona, longe disso. A mulher É A BARBIE! Só que ao contrário do seu namorado loiro, ela não precisa se esforçar para aparecer, seus momentos são centrados em doçura, dilemas, e até um pouco de drama. Representar nossas inseguranças é uma tarefa muito mais interna do que expansiva, e dá pra sentir empatia por seus medos. Mas principalmente, torcemos por ela, especialmente quem é mulher.

A questão do feminismo entra aqui para levantar perguntas, pois ao mesmo tempo que a boneca é uma aliada para a causa, ela é uma inimiga. Quem nunca se sentiu insegura por causa dos padrões de beleza da loira que atire a primeira pedra. Notícia velha, mas é interessante analisar que Ruth Handler – inventora da Barbie – deu às meninas algo para aspirar além de serem donas de casa. Nunca vi muita graça em bonecas bebês, então imagina para uma criança ter a opção de imaginar histórias e se ver em uma boneca. Mesmo que fosse uma autodescoberta estética, foi essencial para que as garotinhas pudessem sonhar. E é importante falar disso, porque o coração do filme é entender a importância de um brinquedo como a Barbie para o desenvolvimento pessoal. Apesar dos defeitos que o roteiro de Noah Baumbach e Greta Gerwig não deixaram passar, a boneca foi um avanço. O risco disso ser um comercial limpinho da Mattel era alto, mas a dupla investiu em uma visão que impactasse as pessoas e não no que era bom pra vender mais Barbies – mas vai vender mesmo assim. Vemos aqui uma versão de como o empoderamento nasce entre as mulheres, e como nós conquistamos coisas quando simplesmente nos unimos, afinal, uma mulher real é sim o reflexo da Barbie, já que ela faz de tudo desde cedo por ser cobrada de ser completa para a sociedade. Uma mãe, boa filha, cozinheira, multitarefa, atenta, graciosa, bonita e perfeita. Não precisamos de uma Barbie pra cobrar tudo isso da gente, já que vivemos essas experiências no dia a dia. Então posso falar com segurança que para aproveitar todo o potencial que esse filme tem pra oferecer, é importante ser mulher. 

A protagonista pode até não mudar o mundo com seus ideais cor de rosa, mas quer dizer que ela deve ser privada de inspirar outras mulheres? Mesmo que algumas? Através do questionamento de sua própria existência aprendendo a desenvolver sentimentos não plastificados, Barbie solidificou ainda mais o legado da boneca na sociedade. O filme é um triunfo e um clássico instantâneo. 

Nota de rodapé:. Fica aqui a recomendação para a série da Netflix ‘Brinquedos que marcaram época’. 

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barbie poster
País: EUA
Direção: Greta Gerwig
Roteiro: Greta Gerwig, Noah Baumbach
Idioma: Inglês

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