Crítica de filme

Crítica | ‘Apertem os cintos, o piloto sumiu’ não funciona mais

Publicado 5 anos atrás

Em 1980 estreava Apertem os cintos, o piloto sumiu (Airplane!, 1980). Disponível no catálogo da Amazon Prime Video, o longa é classificado e, mais do que isso, reconhecido como uma obra-prima da comédia, e não é para menos. Um filme com orçamento estimado de US$ 3,5 milhões e arrecadação de US$ 83,5 milhões de bilheteria é um sucesso absoluto e retumbante das telonas, guardadas é, claro, as devidas proporções de época, cotação da moeda, etc., etc.

airplane otto

Lá no final da década de 70, os diretores Jim Abrahams, David Zucker e Jerry Zucker fizeram história com seu roteiro simples que fez o público se dobrar de rir nas salas de cinema enquanto acompanhava Robert Hays tentando reconquistar a mulher que amava, a estreante Julie Hagerty. O sucesso talvez possa ser comparado com o bem mais recente Se Beber Não Case (The Hangover), de 2009 (orçamento estimado de US$ 35 milhões e arrecadação global de US$ 469,3 milhões).

E assim, divertindo a plateia daquela época, Apertem os cintos, o piloto sumiu teve seus méritos. Como visto, rendeu muito dinheiro para as empresas envolvidas, lançou Leslie Nielsen na comédia (coisa que ele nunca achou ser capaz de fazer tão bem) e imortalizou seus protagonistas (Robert Hays e Julie Hagerty). Entretanto, da mesma forma como uma anedota contada repetidas vezes perde toda a graça, o filme, como comédia, não funciona mais. Suas piadas viraram clichê, o resultado final da obra, visto com olhos atuais, é simplesmente bizarro, e o mesmo público que lá atrás saiu do cinema com a barriga doendo de tanto rir, agora vai se estarrecer.

airplane Leslie Nielsen

Porém não digo isso como algo negativo. Os filmes que envelhecem bem (os chamados “atemporais”) são a minoria e, quando se trata de comédia então… Ao longo do tempo, é difícil e muito pouco provável que nossa percepção em relação ao mundo e à sociedade continue a mesma, ou que uma mesma história, contada no passado e no presente, nos afete de igual maneira. O tempo é implacável. Até mesmo as referências utilizadas pelos diretores, como a famosa cena do beijo em A um passo da eternidade (1958), ficam gastas pelo uso – embora, é claro, não percam sua importância. A culpa não é de ninguém, muito menos dos diretores e do filme!

airplane Robert Hays e Julie Hagerty

Assistir Apertem os cintos, o piloto sumiu hoje, portanto, será uma experiência totalmente diferente. Não será de longe tão divertido como foi em fins da década de 70 (lembrem-se do tal estarrecimento a que me referi!), mas será no mínimo interessante. Cinema também é história e, sendo assim, dá para “sacar” direitinho os valores daquela época e, principalmente, dá para perceber o que nos era “permitido” achar engraçado. Hoje, o filme seria considerado de mau gosto e, mais do que isso, uma afronta ao politicamente correto, uma absurdo inenarrável.

Bater em mulher, pode sociedade? E o racismo que rola solto? É possível brincar com uma pessoa doente em busca de uma doação de órgãos? E a libertinagem sexual que soava tão natural quanto uma viagem sideral nos filmes atuais?

Os tempos mudaram, a percepção mudou e, com ele, o senso de humor. Daqui a 40 anos, o que será que vai acontecer com Se Beber Não Case? Provavelmente a mesmíssima coisa – vai sair da comédia para entrar na história.

Sendo assim, para situar Apertem os cintos, o piloto sumiu no tempo/espaço, peço licença a Elis para fazer uma referência: na parede de memória, essa lembrança é o quadro que ri mais.

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Apertem os cintos o piloto sumiu Poster
País: EUA
Idioma: Inglês

Respostas de 16

  1. É uma critica ao filme ou um manual do politicamente correto? Posso estar estar enganado, mas duvido que alguém, despido de seus preconceitos, viés e etc, consiga assistir esse filme sem dar “muitas gargalhadas”. O curioso é que há pessoas que abominam filmes assim e aplaudem a um “evento artístico” no MAM, em que uma criança toca em um homem nú.

  2. Boa análise. Realmente, tem umas piadas que não seriam permitidas hoje. Revi por que soube que o Stephen Stucker, o controlador de voo afetado e sem noção, morreu aos 38 anos de complicações de HIV. Acho as piadas dele atemporais, como a de descrever o avião como uma coisa linda parecida com uma casinha de bonecas em vez de dar uma resposta técnica. Ou o chefe dando uma ordem indireta “Café, Johnny” e ele respondendo “Não, obrigado”.

  3. Olha a crítica não é contra o filme mais sim da mudança de percepção do agora como e de 80 tudo e diferente pra época de agora muito bem visto .gostei e sobre o filme eu adoro e Rio muito até doer a barriga !!! Kkk

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