Michael Bay é um diretor de estilo inegável. Facilmente reconhecido por seus planos dourados, sua câmera incessante e uma quase fetichização das forças armadas americanas, o diretor estava em baixa recentemente. Seus últimos filmes, Transformers: O Último Cavaleiro e Esquadrão 6 levantaram dúvidas sobre a capacidade de Bay em nos apresentar novos espetáculos pirotécnicos. No entanto, a chegada de Ambulância — Um Dia de Crime mostra que o diretor não só continua firme e forte mas também está na vanguarda das técnicas cinematográficas, mesmo que alguns dos seus posicionamentos problemáticos ainda o acompanhe.
O longa conta a história de Will Sharp (Yahya Abdul-Mateen II), veterano de guerra abandonado pelo governo e soterrado em dívidas por causa do estado de saúde da esposa, que decide procurar seu irmão de criação, Danny (Jake Gyllenhaal), em busca de uma oportunidade de emprego. A tal oportunidade, no entanto, é um ambicioso roubo a banco que pode sanar a questão financeira de Will para sempre. O golpe dá errado e, na fuga, acabam sequestrando uma ambulância com a socorrista Cam (Eiza González) e um policial ferido por eles mesmos dentro. As próximas duas horas abarcam a corrida desenfreada de Will e Danny para escapar da situação enquanto toda a força policial de Los Angeles segue em seu encalço.
Bebendo dos grandes filmes de ação dos anos 90, como Velocidade Máxima, e até de seus próprios filmes, que chegam até a ser referenciados em momentos cômicos (tanto A Rocha quanto Bad Boys são mencionados), Ambulância — Um Dia de Crime não perde muito tempo contextualizando sua história para que entremos na ação o quanto antes. Em menos de meia hora tudo é estabelecido para que a perseguição se torne a grande estrela do filme.
E é aí que Michael Bay brilha. O longa é hábil em sempre aumentar o escopo de sua situação primordial sem que haja uma perda da nossa suspenção de descrença. Exageros são esperados, obviamente, mas Bay consegue imprimir um realismo que até o espectador mais cricri vai ter dificuldade de dizer “que mentirada”. Graças aos drones usados na filmagem, estamos sempre acompanhando a ação de perto, entrando por lugares antes impossíveis para câmeras tradicionais. Por vezes tem-se a sensação de estar a bordo de uma atração de parque de diversões, em um daqueles simuladores de caminhos sinuosos em alta velocidade.
Bay ainda usa seus drones para fazer tomadas vertiginosas, subindo os arranha-céus de Los Angeles para depois chicotear sua câmera para baixo em um rasante alucinante até onde se encontram os personagens. A cidade, por sinal, é um personagem ativo na película. Não a toa que o próprio título do filme marca as letras LA em reconhecimento à cidade. A diversidade cultural do lugar e, em alguns momentos, até seu abandono estão ali retratadas junto à arte de rua. A ambulância de Will, Danny e Cam cruza pelas suas vias como um glóbulo vermelho pelas veias de uma cidade, ao mesmo tempo pulsante e caótica.
Complementando a ação, o trio principal esbanja competência para segurar o lado emocional da trama. Yahya Abdul-Mateen II e Eiza González são a bússola moral do filme, heroicos mesmo quando tomam as decisões erradas. A Cam de Eiza ainda possui um arco mais definindo, indo de alguém que vê o que faz apenas como um trabalho qualquer até reconhecer a diferença que exerce na vida daqueles que salva. Reparem que de três personagens, dois estão do mesmo lado. Porque para balancear essa equação Jake Gyllenhaal eleva a psicopatia de Danny à máxima potência, sendo um dos pontos altos do filme. A alternância entre a calma e a loucura de seu personagem é a fonte das melhores piadas do longa.
Em relação aos temas tratados, Bay parece não se decidir exatamente de que lado está em algumas questões sociais representadas no longa. Enquanto mostra o personagem de Will como um Rambo moderno, o veterano que é abandonado pelo Estado após servir o país, ele não exista em exaltar o exército dizendo que este lhe “deu um propósito” e que “sabia exatamente o que estava fazendo lá fora”. A força policial, há tempos no centro de escândalos envolvendo brutalidade a minorias, é ora retratada como heróis mitológicos, filmados de baixo para cima, ostentando carros e armamentos impecáveis, quase o que se chama atualmente de “copaganda” (em que uma obra tende a mostrar a polícia em uma luz mais favorável em contraste com acontecimentos recentes, vide Brooklyn 99), ora mostrados como inconsequentes, vingativos, dispostos a virar a cidade de cabeça pra baixo para salvar um dos seus. Seriam esses indícios de uma visão mais progressista na filmografia?
Entretanto, essas questões ficam em segundo plano em relação à adrenalina e À força da ação. No final das contas, a locomotiva de Michael Bay não pode parar.