Onze anos atrás, o bruxinho mais famoso do planeta se despedia das telonas e encerrava sua saga. Sem poder mais contar com o material original e a falta de interesse dos protagonistas em continuar a história de Harry Potter, a Warner Bros. Pictures se viu obrigada a olhar para trás na história da franquia, adaptando livremente o livro fictício Animais Fantásticos e Onde Habitam (o livro acabou saltando do universo de Hogwarts para o nosso em 2001) e criando uma série spin-off que chega ao seu terceiro filme com Os Segredos de Dumbledore.
Começar uma nova história com novos personagens sem a presença de qualquer ator do elenco original e apoiando-se apenas na força da marca e nos fãs recém-órfãos da série principal já não seria uma tarefa fácil em condições normais. Somam-se a isso todas as manifestações transfóbicas da sua criadora e a escalação de Johnny Depp, no alto de suas acusações de abuso por parte de sua ex-mulher, para encarnar o vilão principal e você teria uma receita para o fracasso.
No entanto, o primeiro filme homônimo fez considerável sucesso e se mostrou uma aventura divertida recheada de referências para os fãs da série. Os problemas só começam realmente em sua sequência. Animais Fantásticos: Os Crimes de Grindelwald perde o frescor do original e a oportunidade de expandir o universo de Harry Potter de maneira mais ambiciosa para se estabelecer novamente como um embate entre o bem e o mal, reeditando a luta contra Voldemort da franquia-mãe.
Os Segredos de Dumbledore parece consciente das falhas do seu antecessor e tenta colocar a história nos eixos de forma que tanto a audiência casual quanto os fãs fervorosos da saga voltem a se importar com Newt Scamander (Eddie Redmayne) e cia., a começar pela troca de Johnny Depp por Mads Mikkelsen no papel de Grindelwald, um ator menos propenso a caricaturização do personagem.
Mostrando-se muito mais como um ser frio e desprovido de emoções, o Grindelwald de Mikkelsen consegue se tornar uma figura muito mais perigosa do que qualquer coisa que Depp tenha feito nos filmes anteriores. A decisão de colocar Dumbledore (Jude Law) como personagem central da trama é outro esforço bem-sucedido em ancorar o spin-off firmemente na saga original. E obviamente que não falta um sem número de referências aos filmes de Harry Potter para saciar os fãs (que suspiram ao ver Hogwarts enquanto sua música-tema ecoa pela sala de cinema).
Infelizmente essa correções não evitam algo que já é inerente a essa franquia desde sua concepção: nós já sabemos o final dessa história. Ou pelo menos sabemos o suficiente para entender que nenhuma das graves ameaças de Grindelwald ao mundo bruxo ou ao mundo trouxa irá se concretizar. Quando um bruxo é enviado para assassinar Dumbledore, a plateia já sabe que ele não logrará êxito, afinal, Alvo Dumbledore estará vivo anos depois para ajudar Harry a derrotar Voldemort. O máximo que essas histórias fazem é preencher lacunas de informação que não são essenciais para a história principal de Harry Potter.
E mesmo essas informações não parecem tão interessantes em si mesmas. Este terceiro longa cria todo um pano de fundo político sobre uma eleição no mundo bruxo sem nunca explorá-la direito. Seus principais candidatos, entre eles a brasileira Maria Fernanda Cândido, em participação de luxo com apenas duas falas (melhor que o seu concorrente, que nem abre a boca), não são minimamente desenvolvidos. E falando nessa eleição, como que os simpatizantes de cada um dos candidatos levantam cartazes de “vote em fulano” se no final das contas tudo será decidido por um animal mágico que verá qual deles é puro o suficiente para ser eleito?
E por criar essas subtramas desnecessárias que só servem para inchar o tempo de duração do longa, o coração dessa história é quase que jogado para escanteio em uma resolução apressada e sem qualquer inspiração. Qualquer que tenha sido a promessa em relação ao personagem de Ezra Miller sobre sua origem é soterrado por eventos que pouco interessam ao espectador. E quando chega o clímax de sua história, o máximo que a audiência fará é bocejar.
A direção de David Yates, por mais competente que seja, não passa de uma sombra daquele que realizou metade dos filmes originais de Harry Potter. Seu mundo bruxo nada tem de fantástico mais, apenas recriações de filmes mais inspirados. Além do mais adere aos filmes de outras franquias famosas com uma fotografia desprovida de cores; um cinza sem vida. Triste.
O que se pode destacar de positivo sobre Animais Fantásticos: Os Segredos de Dumbledore é que ele conclui tramas o suficiente para abrir caminho para um novo arco de histórias (lembrando que a quarta e quinta partes da franquia já foram anunciadas). Talvez fosse isso que este filme se propôs a fazer: dar um final minimamente digno para um arco tão problemático (na frente e atrás das câmeras) e apontar para um horizonte mais esperançoso. Mas não se enganem: num truque de mágica em que já se sabe o final não há Mister M que dê jeito.