O sistema penal norte-americano e seus problemas sempre foram prato cheio para Hollywood. Todo ano chovem produções do tipo, a ponto dele virar seu próprio sub-gênero, o drama de tribunal. Sejam histórias fictícias ou baseadas em fatos reais, é fato que o público parece não se cansar desse tipo de filme. Entre tantas opções, Luta Por Justiça (Just Mercy) se destaca pela força de seu personagem principal e sua relevância no mundo em que vivemos.
Baseado na história real de Bryan Stevenson, um advogado negro formado em uma das instituições mais prestigiadas dos Estados Unidos, Harvard, o longa conta o início de sua jornada em defesa de minorias injustamente condenadas à morte. Adiciona-se a essa situação o fato de Stevenson escolher o estado do Alabama, lugar notório de movimentos e ataques racistas, para começar sua operação, oferendo suporte legal a detentos que não possuem condições de financeiras para se defender nos tribunais.
Entre esses condenados encontra-se Walter “Johnny D” McMillian, acusado de assassinar uma adolescente branca de 18 anos na cidade de Monroeville. Baseado apenas no testemunho de um criminoso que parece ter sido coagido a incriminar McMillian, ele aguarda sua vez no corredor da morte. Cabe a Stevenson juntar as provas necessárias para que o caso volte a ser julgado e que a verdadeira justiça seja feita. Contra as autoridades e o próprio sistema, ele colocará sua vida em jogo para provar a inocência de McMillian.
Em mais uma performance impactante porém contida, Michael B. Jordan interpreta o advogado idealista. Por mais que seus princípios sejam inabaláveis, Jordan confere uma fragilidade a seu personagem em momentos de ameaça e humilhação. A tensão em seu maxilar e seus olhos levemente marejados são toques sutis que nos dão uma ideia do que passa em sua cabeça nesses momentos. A direção de Destin Daniel Cretton é hábil em aumentar essa tensão com closes levemente trepidantes nos colocando junto ao personagem. A atuação de Jamie Foxx no papel de Mcmillian é igualmente poderosa, nos apresentando um personagem resignado ao papel que a sociedade lhe impôs, mas sem perder sua dignidade. São dele as cenas mais emocionantes do filme, especialmente quando contracena com seus dois companheiros de confinamento (os bons O’Shea Jackson Jr. e Rob Morgan). Fechando o elenco principal temos a talentosa Brie Larson que, infelizmente, é relegada a um papel de pouca importância na trama, aparecendo quase como uma coadjuvante de luxo.
Tocando em assuntos importantes e tristemente atuais, o filme escancara o preconceito do sistema judicial americano, que abandona os menos favorecidos e os deixa a mercê de uma elite racista que os quer longe dos centros urbanos. Luta Por Justiça consegue ainda inserir uma fina camada de ironia ao ressaltar que a cidade onde a história se passa também é a terra natal da escritora Harper Lee, autora de O Sol É Para Todos, um dos maiores clássicos da literatura americana justamente sobre desigualdade racial. O momento em que a secretária do promotor da cidade recomenda o museu dedicado ao livro para o personagem principal chega a ser engraçado em sua hipocrisia.
Por mais que se entregue aos clichês do gênero, com as previsíveis reviravoltas no caso, Luta Por Justiça consegue se sobressair na força de suas atuações principais e principalmente em sua mensagem esperançosa de que ainda existem pessoas dispostas a lutar pelo que é certo, não importando as consequências. Nos tempos tristes em que vivemos, apenas isso já vale o ingresso do filme.