Escrever sobre Manchester à Beira-Mar é um exercício de resistência. É tentar falar com a garganta apertada por um nó que não se desfaz. Luto é um embate diário contra a dor mais profunda que se pode sentir. Quando meu avô faleceu, aos 94 anos, imaginei estar preparado. Afinal, eu me preparava para aquele momento há anos, desde que sua impressionante saúde começou a dar sinais de declínio. Mas quão enganado eu estava.
No fim, não há preparo possível. Não há resiliência mental capaz de preencher o vazio deixado por quem amamos. O consolo de familiares, os gestos de amigos, a rotina automática do dia a dia — nada disso impede o sono perdido ou as lágrimas que surgem, imprevistas, frente à menor lembrança. A ausência do meu avô foi sentida em tudo: no café da manhã que ele sempre preparava, nos jogos de xadrez, nos truques de baralho que me ensinou, e — acima de tudo — na falta de seu abraço quando mais precisei. Como amei aquele homem. E como ele faz falta, ainda hoje, sete anos depois.

Único em abordagem e carregado de humanidade, Nickel Boys é um retrato devastador e honesto de como a opressão e abuso roubam oportunidades.
Lutar contra o luto é enfrentar um épico silencioso, feito de pequenas batalhas que deixam cicatrizes profundas. Ainda choro ouvindo certas músicas que ele costumava tocar, mas hoje encontro mais consolo do que dor nas memórias que carrego. Saí relativamente ileso. Meu pai, por outro lado, ainda sofre com a insônia — uma lembrança viva de que algumas feridas simplesmente não fecham.
Essa é a minha análise do belíssimo Manchester à Beira-Mar. E, não se engane, eu não fugi do tema. Sim, eu poderia falar da impressionante construção de Lee Chandler (Casey Affleck) usando de força e sensibilidade para seguir em frente após a morte do irmão, ou da cena arrebatadora de Randi Chandler (Michelle Williams) — que merecia ser discutida por uma eternidade. Poderia comentar sobre a fotografia opressora, o tom gélido e sombrio que permeia cada quadro. Mas, no fundo, nada disso importa tanto.
Porque a verdadeira força desse filme não está na história que ele conta, mas na dor que ele desperta em cada espectador. Manchester à Beira-Mar é universal, mas ecoa de forma única em cada um de nós. O filme termina, os créditos sobem, talvez algumas lágrimas sejam enxugadas — mas o que persiste é aquilo que ele nos obriga a lembrar: quem perdemos, e como seguimos em frente.
Algumas obras nos emocionam pelo que mostram. Esta nos emociona por tudo o que nos faz reviver. E porque luto é uma merda.