Meu Casulo de Drywall é um filme brasileiro de 2023 e segue de forma intrigante os eventos que cercam uma tragédia após o aniversário de 17 anos de uma menina em um condomínio de luxo. O filme tem circulado por festivais de cinema pelo mundo desde o ano passado e estreará nos cinemas brasileiros no dia 12/09.
Dirigido por Caroline Fioratti (de Meus 15 Anos, com Larissa Manoela), Meu Casulo de Drywall centraliza os conflitos de diversas famílias ricas que vivem próximas. A história, por si só, a princípio, não é tão envolvente, permanecendo o tempo todo focada em problemas da classe alta paulistana, quase ao estilo de Walter Hugo Khouri, porém com um tom mais intimista e personagens que parecem caricaturas de si mesmos.
Parte do sucesso de Meu Casulo de Drywall reside na habilidade da diretora em explorar a intensidade dos sentimentos na adolescência. Como mencionado em um artigo de 2020, quando o filme ainda se chamava Sobre Girassóis, a intenção era criar uma película sobre jovens, feita para adultos compreenderem. Isso funciona, mas só depois que conhecemos melhor os personagens. Nem todo espectador, no entanto, terá a paciência necessária para isso.
Virgínia (Bella Piero, a Nina de Verdades Secretas), a protagonista, é filha da socialite Patrícia (Maria Luisa Mendonça) e do juiz Roberto (Caco Ciocler). Ela carrega um conjunto de dores que se complementam com o ambiente claustrofóbico presente no próprio título do filme. É possível perceber essa dor e se identificar com ela apenas no início do filme, se conseguirmos nos desprender do preconceito que esse ambiente quase alienígena desse cercadinho de drywall pode provocar.
Infelizmente o caminho mais fácil foi escolhido para criar os personagens, o que causa uma primeira impressão, se não incômoda, pelo menos limitada em relação ao potencial do filme. Por exemplo, Virgínia, uma adolescente branca e rica, é uma garota solitária. Seu pai é agressivo e distante, enquanto sua mãe, (que se chama e é uma) Patrícia, é superprotetora e alienada. Não é necessário dizer quantas vezes tais personagens figuraram em alguma obra audiovisual. Portanto, essa forma plana como os personagens são apresentados não se limita à protagonista, o que por si só já seria problemático.
Virgínia tem amigos e colegas, claro, igualmente bidimensionais. Um deles, interpretado por Daniel Botelho (o Joca de Mãe Só Há Uma), é um antigo conhecido que vive em fóruns online e é claramente um esquisito que se inspira em casos de tiroteios em escolas (Fioratti revelou que Elephant, de Gus Van Sant, é uma das suas inspirações). Outra personagem que parece ter saído de um estudo de personas de marketing é Nicollas (Michel Joelsas, o pequeno Mauro de O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias), namorado de Virgínia. Ele foi criado com uma rígida educação direcionada, mas no fundo é bem diferente do que tenta aparentar.
Por fim, temos a melhor amiga, interpretada por Mari Oliveira (protagonista do interessante longa brasileiro Medusa). Ela é a única negra moradora do condomínio e é hipersexualizada pelos pais de seus amigos, também aproveitando-se da fama de sex symbol. É difícil perceber se tais arquétipos são intencionais, uma vez que, primeiramente, eles atrapalham, sendo genéricos e distanciando a narrativa da realidade.
No entanto, quem assistir e tiver paciência suficiente para enxergar além do padrão maçante que essas personalidades poderiam promover, encontrará momentos excelentes. Quem também tiver a calma para passar pelos momentos em que até o texto se vê preso em um condomínio de ideias, verá que Meu Casulo de Drywall é competente em nos fazer sentir e nos identificar com a história. Quando os temas universais, como depressão, drogas, conflitos sociais e sexualidade, entram em cena, surge uma intrigante tridimensionalidade nas personagens, tanto dentro quanto fora de si mesmas.
A atuação de Bella Piero consegue transmitir a sensação de uma pessoa que se movimenta quase imperceptivelmente em meio à dor, parecendo o tempo todo distante e afetada. Maria Luiza Mendonça faz brilhantemente um papel com o qual já está acostumada em dramas desse tipo e naturalmente é o maior destaque do longa. Após um começo complicado e uma parte repetitiva antes do terço final do filme, temos uma obra muito interessante, que traz uma mensagem legítima, apesar de tudo.
O grande ponto positivo, que pode fazer você não desistir de conhecer os personagens, são as imagens. Tanto as tomadas na festa, quanto as metáforas visuais conseguem, de forma muito simples e direta, traduzir o sentimento e a relação entre as personagens. Olhando para filmes brasileiros como um todo, algumas decisões da direção artística e da fotografia (coordenadas por Hélcio Nagamine) são novidades excelentes. Essas qualidades se sobressaem aos defeitos e podem promover um fascínio que transcende os momentos mais chatos da obra. Toda cena parece muito bem cuidada do ponto de vista autoral e isso é um bom motivo pra ir ver.
Portanto, se há algo que retira esse filme da mesmice e nos aproxima de personagens cuja realidade parece tão distante, é a capacidade de traduzir (muito mais pela estética do que pelo texto) sentimentos complexos com muita sensibilidade. Existem ali, escolhas bem pensadas, que conversam conosco quando jovens e com quem somos agora, quase como em uma reflexão dialética. É uma tentativa válida de representar feridas maiores do que os clichês da história nos pressionam a observar. Se tiver um tempo, assista Meu Casulo de Drywall, um filme, que apesar de tudo, resiste belo.
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show!