O mais novo live action da Disney, Mulan, da diretora Niki Karo e estrelado por Yifei Liu já havia causado polêmica e preocupação muito antes de seu lançamento no Disney+, a recém difundida plataforma de streaming do Mickey.
À medida que as notícias, as imagens e os vídeos sobre o longa iam sendo divulgadas na imprensa, mais os fãs indagavam sobre se o filme seria realmente um live action baseado na famosa animação de 1998; e mais os chineses se invocavam com a “americanização” de sua cultura. Para piorar, adveio a pandemia do Covid-19 e, mesmo com o relaxamento da quarentena alguns meses depois, a Disney optou por lançar o filme diretamente no streaming, enfurecendo os donos de cinemas ao redor do mundo (inclusive fazendo alguns destruírem os materiais de divulgação com tacos de beisebol).
Mesmo assim, a vida seguiu e o tão aguardado longa estreou com uma fotografia de tirar o fôlego e a grandiosidade esperada de uma obra com o selo da Disney. Mulan é inegavelmente lindo, colorido, um filme forte e sim, ocidentalizado.
No entanto, para o verdadeiro fã da casa do Mickey dos anos 90, o novo longa não funcionou, e os motivos são óbvios. A falta de personagens chave e a trilha sonora tímida fizeram tremenda falta, e a mágica que tinha o musical não existe agora em 2020. Essa mágica foi trocada por outra totalmente diferente e, mesmo que possa ter seu mérito, decepciona, porque o filme não é uma versão independente da lenda de Mulan, mas sim, um claro live action da animação, e assim sendo, o fã queria os personagens queridos, queria ouvir as frases conhecidas e icônicas, queria fidelidade, enfim, queria aquela magia de volta. Mas não a teve.
Por isso, separei uma comparação entre os dois filmes e o poema base do longa mais recente, que você pode conferir abaixo.
Live action x animação x Balada de Hua Mulan (poema)
A introdução
Comecemos do começo. No live action foi inserida uma introdução com a infância de Mulan, coisa que não acontece na animação, uma vez que não era absolutamente necessário. Tal artifício, porém, nem seria um problema, não fosse ter sido adicionado somente para introduzir na história o tal do chi – outro elemento que não tinha a menor necessidade de existir, já que soou como um superpoder divino que somente homens poderiam ter e que, por algum desvio inconveniente do destino, coube a uma mulher. Como consequência, ela é instruída pelo pai amoroso a escondê-lo e jamais revelá-lo.
Mulan tem uma irmã
Na animação de 1998 Mulan é filha única, mas essa é apenas uma diferença inofensiva, porque o fato de ela ter uma irmã no live action não mudou absolutamente em nada a história. No poema Balada de Hua Mulan, entretanto, ela também tem um irmão mais novo que foi completamente ignorado no filme.
Mulan é desastrada
Ser um pouco desastrada é uma característica da Mulan do musical, que é com certeza bem mais desajeitada do que se mostrou agora em 2020. Aqui, nossa heroína possui total domínio de seu corpo e de seus “poderes” (o tal chi) – ela só os esconde. Lá em 1998, ela só adquire disciplina quando entra para o exército (e mesmo assim, depois de um tempo).
Não tem Mushu
Um dos personagens mais queridos do musical, Mushu está ausente no live action, mas isso nós sabíamos de antemão e era um dos vários pés atrás dos fãs de Mulan, como já referido acima. No longa de Niki Caro, o dragãozinho carismático e falante foi substituído por uma fênix silenciosa. Curiosamente, Mulan quebrou a asa da fênix de pedra quando pequena, assim como Mushu quebrou o dragão de pedra na animação, tomando seu lugar como protetor da garota.
O gavião é uma bruxa
Na animação, o terrível Shan-Yu, dos Hunos, possui uma águia de estimação que o ajudava a ter noção acerca da localização do exército imperial. Já no live action, optaram por transformar a águia de Böri Khan (Jason Scott Lee, o Shan-Yu de 2020) numa bruxa metamorfa que ajudava o terrível líder contra o império da China. Como dito, é uma das mágicas desnecessárias que a diretora neozelandesa quis inserir em seu filme.
Mulan e todos que possuem o tal chi, voam
Outra dessas mágicas é o fato de Mulan e os outros personagens que possuem o tal chi terem a capacidade de voar e também de terem super força (bem, chutar uma vara com a força que ela chuta em vários momentos do filme não é para qualquer um), num claro objetivo de empoderamento exacerbado e completamente dispensável. Mulan já era uma grande heroína sem precisar de todos os novos poderes que lhe deram.
Shang e os outros companheiros de Mulan são ainda mais secundários
Quem conhece o musical de 1998 sabe que Mulan se apaixona pelo comandante do exército imperial da China, Li Shang, que não existe no live action, seu papel podendo ser atribuído a Honghui (Yoson An) – apenas mais um dos soldados do acampamento -, que nem de longe tem a importância que o personagem deveria ter.
Já quanto aos outros engraçados companheiros da protagonista, Yao, Chien-Po e Ling, estes são ainda mais secundários, quase figurantes nessa nova versão, o que é realmente uma pena, vez que são responsáveis por bons momentos da animação e que, logicamente, poderiam ter sido melhor aproveitados e explorados.
Faltaram as músicas
Outro fator que já era conhecido de antemão, é a ausência das belas músicas que são parte da magia da animação. A temática pesada da guerra foi a justificativa que nos foi dada para tal absentismo. Como fã inveterada da Disney, esse foi o elemento que, em minha opinião, mais fez falta.
Dessa forma, o live action se limitou a colocar alguns acordes aqui e ali, e inserir algumas frases das músicas (facilmente reconhecíveis para quem conhece o musical) em momentos específicos. Porém, o artifício não ajudou a minimizar a falta que a música fez.
Concluindo
Sendo assim, é uma pena assistir ao que a Disney está fazendo com a grande maioria dos seus recentes live actions. Por outro lado, é também claro que as equipes de produção entendem o esplendor, a beleza e a força que tiveram (e ainda têm) os clássicos da conceituada e gigantesca empresa cinematográfica. Ademais, sua competência em termos tecnológicos e técnicos é indiscutível. Mas infelizmente, por motivos externos inerentes à sociedade desse começo de século XXI, essas mesmas equipes não estão sabendo reproduzi-los, ficando aquém de seus antecessores.
Por todo o exposto, conclui-se que Mulan chegou realmente com o slogan de live action do musical de 22 anos atrás, bem como do poema chinês Balada de Hua Mulan, mas melhor teria sido se assim não fosse. O filme de Karo se mostrou somente mais um filme protocolar para agradar determinado setor da sociedade. E esse setor com certeza não foi o dos fãs da heroína.
Respostas de 2
Adorei o filme, não me prendi ao passado,afinal de contas,nem vi a animação.
Sim! Ter visto a animação faz a gente ter uma visão diferente!