Toda vez que um novo ator assume um papel de grande responsabilidade, é possível sentir o mundo prendendo o ar de forma coletiva. No caso de Robert Pattinson se tornando o Cavaleiro das Trevas (e olha o tamanho dessa responsabilidade), a inspiração foi ainda mais profunda, já que muita gente ainda não esqueceu (e talvez nunca vá esquecer) seu vampiro brilhante e romântico de Crepúsculo… E, no entanto, Matt Reeves escreveu The Batman com o astro em mente.
É preciso reconhecer que há muito que Pattinson já superou o Edward e se mostrou um ator mais do que competente, digno de se tornar, portanto, o Homem-Morcego, um Batman muito diferente de tudo o que já vimos no cinema até agora.
Por isso, esqueça qualquer versão playboy do personagem, o bilionário atormentado, mas bon vivant cercado de mulheres que conhecemos, porque aqui ela não existe. No filme que o diretor Matt Reeves concebeu, Bruce Wayne é solitário, um rockstar recluso e ensebado que usa maquiagem preta nos olhos por baixo da máscara de morcego. E o mais interessante é que essa maquiagem não desaparece depois que ele retira a máscara, mas escorre com o suor e mancha seu rosto, aumentando a teatralidade e dando maior credibilidade para a caracterização que o cineasta imaginou.
E essa caracterização é explicitamente e essencialmente noir, de corpo e alma. Sendo assim, a fotografia é tão escura que é quase preta e branca, a voz em off do personagem principal (o Batman detetive), narra seus sentimentos para o expectador, Zoë Kravitz e sua Mulher-Gato encarnam uma genuína femme fatale e o clima é notavelmente pessimista. Eis o noir em seus mais puros elementos constitutivos que, no contexto de uma história do Cavaleiro das Trevas em especial, funcionou maravilhosamente bem.
E é nesse ínterim, enquanto Bruce, em sua identidade secreta, investiga as misteriosas mortes que começam a acontecer em Gotham, que Matt Reeves começa a trabalhar com o medo e as referências do terror. Aqui se sobressai um lado mais sombrio do herói, um lado bestial que não tem medo de usar da violência e das sombras mais densas para se impor. E ele bate muito, usando muito mais os próprios punhos do que qualquer artefato. Até mesmo o Batmóvel se preocupa muito menos com o design moderno e aerodinâmico do que em assustar quem ouve seu ronco ou o divisa nas sombras da noite.
Aqui o Batman está menos tecnológico, menos galã e mais assustador, grande, pesado, seus passos retumbantes fazendo o chão e os bandidos tremerem – as únicas exceções são os terríveis Carmine Falcone (John Turturro) e Edward Nashton, O Charada (Paul Dano).
E este último, inclusive, vale quase que todo o filme. Paul Dano está tão perfeito no papel do vilão lunático e psicopata que também assusta e encanta. Sendo assim, e com o perdão do trocadilho infame, creio que o ator deverá causar muitos danos em seu concorrentes na próxima temporada de premiação.
Por tudo isso e por todo o esmero que teve é que Matt Reeves merece todo o reconhecimento nesse seu filme que marca o começo de uma nova franquia do herói das trevas. Seu diferencial está nos detalhes, no figurino menos “estilizado” e consideravelmente mais simples – ainda mais se pensarmos nos filmes do Batman dos anos 1990 (lembram-se da vestimenta do Charada de Jim Carrey, ou da aparência do Pinguim de Danny DeVito, por exemplo?) -, na bela fotografia e principalmente na ousadia de fazer algo diferente, tudo em detrimento de seu longo tempo de duração (175 minutos).
Portanto, para aqueles que se preocupavam com o vampiro no papel do morcego (que ironia, não?), podem relaxar! Ele agora virou um verdadeiro monstro vingador, um rockstar que começou a aterrorizar a bandidagem de Gotham e a subir ainda mais no conceito do público.
E quem sabe The Batman vai fazer até quem não curtia ou mesmo não conhecia noir, a começar a gostar do estilo.