Crítica de filme

O Poço 2

Publicado 2 meses atrás
Nota do(a) autor(a): 4.0

Em 2019, aprodução espanhola da Netflix O Poço (El hoyo) fez um barulho considerável na plataforma. E eis que, cinco anos depois, de mansinho, chega ao streaming a sequência do longa, uma aposta ousada, dado a controvérsia do final ininteligível do filme original, que gerou bastante descontentamento depois do desenvolvimento surpreendente da trama. Mas será que O Poço 2 (El hoyo 2) redimiu seu antecessor, ou foi mais um daqueles filmes cujo projeto nem deveria ter sido pensado?

Para quem não se lembra, O Poço se passa em uma prisão peculiar. Ela é vertical, e cada cela possui um buraco no meio por onde desce uma plataforma com a comida do dia. No entanto, a prisão tem 333 níveis, um verdadeiro arranha-céu (ou arranha-centro da Terra, vai saber!) e é raro que a comida chegue aos andares inferiores (tente ficar comendo só uma pequena porção por dia da mesma comida por meses a fio!).

Leia também

No Ritmo do Natal Netflix

No Ritmo do Natal

Novembro chega trazendo duas certezas: o início da temporada de filmes natalinos e o avanço da missão furtiva da Netflix de absorver a estética do

O Poço 2 mantém essa ideia, é óbvio, brincando com a ideia de testar até onde vai a racionalidade humana. Goreng (Ivan Massagué) não está mais no centro da trama, mas ele e Trimagasi (Zorion Eguileor) têm sua participação na sequência. Agora voltamos no tempo para acompanhar Perempuán (Milena Smit) em sua luta pela sobrevivência dentro da prisão. Sim! Os acontecimentos desse filme se passam antes dos acontecimentos do filme original, o que deixa as coisas ainda mais interessantes.

Perempuán começa a história no nível 24 com o companheiro Zamiatin (Hovik Keuchkerian, o Bogotá de La Casa de Papel), uma das personagens mais interessantes do enredo. Logo no primeiro dia, eles descobrem que os detentos estão divididos em duas linhas: aqueles denominados Leais, seguidores de um determinado messias que aparece na prisão, e os Bárbaros. Inspirados pela Revolução Solidária, os Leais impuseram uma Lei de que os detentos dos níveis superiores deveriam zelar pela comida para que ela chegasse aos níveis inferiores. Você só poderia comer o seu prato ou, então, negociar uma troca com outro detento. Para manter esse espírito solidário, surgiram os Ungidos, os líderes dos Leais, a “guarda” revolucionária. Quem não seguia a regra, era rigorosamente punido, com penas que variavam desde amputações e tortura até a morte.

A violência, aliás, é outra das características de O Poço, mostrando que quando nossos limites são testados, não nos diferenciamos em nada dos outros animais e nos entregamos completamente a nossos instintos primitivos. E ela está presente em cada momento do filme, inclusive em sua forma moral.

Mesmo assim, é óbvio que nem todos obedecem aos fanáticos. Surgem então os Bárbaros, implacavelmente perseguidos pela inquisição dos revolucionários, estes últimos ilustrados na figura do Ungido Dagin Baba (Óscar Jaenada), um homem cego (em clara alusão ao símbolo da justiça), e do fanático que Zamiatin carinhosamente apelida de Robespierre.

E fanatismo é a palavra que define O Poço 2, em especial o fanatismo messiânico. E é aí que ele se afasta um pouco do filme anterior. Em um dado momento, Zamiatin diz a Perempuán que o imaginário não serve para nada, mas a película nos revela o que acontece quando ele se transforma em idealismo, em crença cega na ideologia de um homem, ou de uma facção, cegando-nos para a razão.

Assim, O Poço 2 repete com sucesso a fórmula do primeiro filme, inclusive aquele do final ininteligível que força a inteligência e nos faz torcer para que surja uma nova continuação que deixe claro quem são aquelas crianças e qual é o real papel delas na história toda. Sempre há a possibilidade! Enquanto isso, aproveitem a trajetória de um dos espelhos mais crus da nossa sociedade.

‘O Poço 2’ está disponível na Netflix.

Compartilhar
o poco 2 cartaz

O Poço 2

El hoyo 2
País: Espanha
Direção: Galder Gaztelu-Urrutia
Roteiro: David Desola, Galder Gaztelu-Urrutia, Egoitz Moreno
Idioma: Espanhol

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *