Há mais de um século, o autor irlandês Bram Stoker publicava sua obra prima, um romance epistolar que marcaria para sempre o imaginário das pessoas, geração após geração. Sucesso da literatura e considerado por muitos como o melhor de seu gênero, a primeira adaptação de Drácula para as telonas ocorreu 25 anos após sua publicação, em 1897, mas foi somente em 2014 que um dos melhores filmes baseados no livro do príncipe das trevas foi laçado: Drácula: A História Nunca Contada (Drácula Untold), do diretor Gary Shore.
Protagonizado por Luke Evans, que encarnou brilhantemente o vampiro mais famoso do mundo, o longa apresenta não só um excelente roteiro, dinâmico e completo dentro de seus 92 minutos de duração, como também dá uma aula e tanto sobre arte. Tanto é assim que a Transilvânia criada por Shore não é apenas sombria e amedrontadora, como a lenda de Drácula nos faz crer, mas é também uma pintura no mais puro estilo renascentista.
Ora, em muitos dos planos do filme é possível se sentir dentro de umas das imagens de Michelangelo, como aquela do teto da Capela Sistina, no Vaticano, ou – e talvez essa seja uma comparação melhor – em uma das imagens do Inferno de Dante, de Sandro Botticelli. É como se as tivéssemos apreciando através da tela, só que em movimento. Os quadros estáticos do plano de fundo também dão ao longa um aspecto meio teatral, mas sem comprometer o belíssimo cenário da Romênia da história.
E por falar em inferno, não há como versar sobre o filho do demônio sem esbarrar no tema da religião, e não foi diferente em Drácula: A História Nunca Contada. Assim, na versão de Shore, Luke Evans teve a missão de encarar um personagem bastante ambíguo, que é ao mesmo tempo o sofrido, leal e perigoso príncipe Vlade – o Lorde Empalador -, e o monstro no qual foi obrigado a se transformar, o implacável e sedento Conde Drácula. Só que mesmo no auge de seu poder conferido pelas trevas, ele nunca deixou de se reportar a Deus, pedindo força e orientação, como mostra a cena em que ele conversa com o filho na capela, uma das mais simbólicas da trama.
Assim, transformar-se em um vampiro nunca esteve nos planos de Vlade, que só queria viver em paz em sua amada Transilvânia. Mas o Mestre Vampiro, vivido pelo excelente Charles Dance, não pensava assim. Para ele, oferecer o próprio sangue para o príncipe, transferindo assim seu poder, era apenas um jogo, um jogo perigoso de morte e força de vontade em que amor, comprometimento, extinto de sobrevivência, orgulho, sede de poder e vingança vão travar uma sangrenta batalha.
E aí vem a ironia! O amor de Vlade pela mulher, Mirena (Sarah Gadon), e pelo filho, Ingeras (Art Parkinson), não é suficiente para classificar Drácula: A História Nunca Contada como um romance – e não era mesmo essa a intenção -, mas consegue tirar o longa da classificação do terror, torando-o uma película de muita ação, drama e fantasia, como bem nos diz o IMDB (veja aqui).
Se você ainda não assistiu, não sabe o que está perdendo, mas ainda há tempo. Pegue o balde de pipoca e aperte o play. Que os jogos comecem.