O tempo e nossa relação com ele sempre foram temas que permeiam a obra de Christopher Nolan. Seja em A Origem, Interestelar e até Dunkirk, o tempo sempre cumpre um papel essencial nessas histórias. Faz sentindo, então, que Tenet, filme mais recente do diretor, use desse artifício para ancorar sua trama.
Entrando no mundo da espionagem, o longa conta a história dO Protagonista, um agente especial dado como morto para enfrentar uma ameaça que pode acabar com a humanidade como a conhecemos. Tal ameaça é materializada em objetos enviados do futuro cuja entropia encontra-se invertida, leia-se objetos que se movem na direção contrária ao fluxo temporal como conhecemos. Uma bala invertida, por exemplo, sai do local de impacto diretamente para uma arma, em um movimento reverso. Esse conceito acaba se expandindo ao longo do filme não só para objetos, mas também para pessoas.
Essa é uma premissa tipicamente complexa para Nolan, que a usa para criar ótimas cenas de ação e impulsionar as viradas na história, mas como em outros projetos do diretor/roteirista, as explicações acabam tomando uma porção considerável do longa.
Cada vez que somos apresentados a uma nova ideia, somos bombardeados com diálogos expositivos que tentam dar alguma legitimidade aos feitos extraordinários da trama. É irônico notar, no entanto, que na primeira das explicações sobre os objetos invertidos, a cientista (desperdiçando Clémence Poésy em apenas uma ponta) resume sua explicação a: “apenas acredite”, o que seria o suficiente para nós espectadores, mas essa não será a última vez que os personagens precisarão ser explicados disso.
Essa sanha por esmiuçar detalhes dos conceitos fantásticos pode até vir a ser considerado um “nolanismo”, de tão recorrente isso é em sua filmografia e, ao mesmo tempo que parece querer se aprofundar em assuntos sérios como o direito ao livre-arbítrio, a forma fria com que trata seus personagens acaba tornando a discussão rasa e emocionalmente distante de seus espectadores.
Mas isso acaba sendo um detalhe se focarmos no que o diretor quer nos oferecer com sua obra. Tenet é, em seu cerne, um filme de James Bond com as reviravoltas no tempo de um De Volta Para o Futuro (mais especificamente o segundo). Todos os elementos vistos em tela evocam o famoso agente: o jeito sarcástico, mas letal do protagonista, as belas locações em diversas partes do mundo, o vilão exagerado, as cenas de ação mirabolantes etc. Claro que pelo ponto de vista de Nolan essas representações assumem tons mais sérios e formais, como se uma escola de samba tivesse que desfilar em um 7 de setembro.
Visualmente falando não há o que repreender em Tenet. Filmado em sua maioria com câmeras IMAX com filme de 70mm, a ação não é nada menos que épica. Se você for ao cinema, tenha certeza de que a melhor maneira de assistir ao filme é nas salas munidas dessa tecnologia. A ação toma conta da tela gigante e a sensação de imersão realmente impressiona. A cena do avião se chocando com um hangar, sem efeitos de computação gráfica, fazem valer a pena o ingresso mais caro. As idas e vindas do tempo no filme também são representadas visualmente no filme, com cenários ou elementos em vermelho representando o fluxo natural do tempo ou em azul para ressaltar o fluxo contrário. Até nos adereços essa diferença é evidenciada, uma vez que aqueles que se encontram no tempo precisam usar máscaras de oxigênio.
Também conta a favor de Nolan o grande elenco reunido. John David Washington é um protagonista (no caso de Tenet, literalmente) nato, alternando entre várias emoções com um talento impecável e alta intensidade. Robert Pattinson confere a Neil o nível certo de mistério e simpatia como o fiel escudeiro dO Protagonista. Elizabeth Debicki está no papel que vai chamar a atenção de Hollywood para seu talento e a única nota destoante é Kenneth Branagh com seu vilão um pouco acima do tom do filme.
Em resumo, por mais que se disponha a tratar de assuntos como viagem no tempo e o peso de nossas decisões, estes temas são deixados de lado em favor de cenas espetaculares de ação e uma atmosfera de tensão que prende qualquer um na cadeira até o fim. Tenet é entretenimento puro e nada mais. E não há nada de errado nisso.