Crítica | Festim Diabólico

Alfred Hitchcock é considerado por muitos o melhor diretor de cinema da historia, o que não é de se admirar. Até os mesmo os filmes dos quais ele próprio não se orgulha tanto são infinitamente melhores do que a maioria das obras que vemos por aí até hoje, muitos anos depois de ele ter nos deixado. Esse é o caso de Festim Diabólico (Rope, 1948), de cuja forma utilizada o diretor chegou a se arrepender e, mesmo assim, é algo notável.

A película conta a história de dois homens que, para provar que poderiam cometer o crime perfeito, matam um colega de classe poucos minutos antes de oferecerem um jantar em seu apartamento, convidando os pais e a ex-noiva da vítima para o evento.

Assim sendo, muito se pode dizer sobre Festim Diabólico, inclusive sobre as controvérsias que o filme gerou na época em que foi produzido por tratar da homossexualidade implícita entre Phillip (Farley Granger) e Brandon (John Dall) – os assassinos -, porém, apesar de tudo, não é difícil perceber que estamos diante de uma grande obra, a despeito de alguns probleminhas que, de tão pequenos, passam despercebidos pelos espectadores.

Nesse ínterim, planejada para ser filmada em plano-sequência – o objetivo era passar uma sensação mais real da história para o público -, a película acaba pecando nos cortes escondidos que, de tanto repetirem a mesma técnica (fechar o plano na roupa escura desse ou daquele personagem), tornam-se explícitos.

O filme, no entanto, atinge perfeitamente seu propósito e, por si só, é intrigante e envolvente o bastante para nos prender do começo ao fim, seja para chocar com a audácia, a arrogância e o sangue frio de Brandon, seja para saber se, no final, a dupla de assassinos será descoberta em razão da ansiedade de Phillip.

Festim DiabólicoPost
Festim Diabólico / 1948 © Divulgação Sinny

No entanto, o melhor de Festim Diabólico é que Hitchcock não perde tempo com cenas irrelevantes, cada minuto sendo reservado para o que é importante. De forma ágil e competente somos apresentados aos personagens, conhecemos suas personalidades, engatamos no enredo e nos dirigimos para o desfecho, sem subterfúgios vazios ou menores para aumentar o tempo de tela (é claro que o fato de só haver um cenário – o apartamento de Brandon e Phillip – ajuda bastante nesse quesito, mas esse detalhe nem de longe torna o filme menos interessante).

E ainda assim, não é só aí que o grande diretor se destaca. Impressiona a forma como ele torna todo o processo de cometimento de um crime numa espécie de religião, cultuada por uma mente doentia e uma filosofia deturpada adquirida de um ex-professor excêntrico. Assim James Stewart entra em cena. Ele interpreta Rupert Cadell, o mentor dos dois assassinos, um homem petulante de ar arrogante que sabe irritar todos a sua volta (inclusive o público!), mas incutiu em seus pupilos uma ideia de divindade intrínseca a homens de inteligência superior que, alimentada pela vaidade – que é mais exacerbada em uns do que em outros -, leva à realização de atos escusos e tortuosos.

Tal conceito é o ponto alto do filme e a forma notavelmente simples com que é mostrado é a marca de quem sabe fazer cinema. Noções de filosofia, arte e até mesmo um pouco de antropologia passeiam pelo roteiro tão naturalmente quanto o suspense que domina o enredo, eficiente e angustiante por si só.

É dessa maneira que, com Festim Diabólico, Hitchcock nos presenteia com mais uma de suas obras que, mesmo não sendo a maior de seu celebrado legado, destaca-se no imenso firmamento de filmes que começou a ser formado há mais de um século e do qual o cineasta é até hoje uma das estrelas mais brilhantes.

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Nota do(a) autor(a)

/5
Festim Diabólico Poster
Título original:
Ano:
1948
País:
EUA
Idioma:
Inglês
Duração:
80 min min
Gênero:
Diretor(a):
Atores:
James Stewart, John Dall, Farley Granger

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