Artigo | Crepúsculo – Vergonha alheia e própria?

Meu Deus, como eu amei Crepúsculo (Twilight). Stephenie Meyer entrou na minha mente, eu admito, com sua história subversiva sobre vampiros, que passaram de seres de contos de terror a personagens de um romance teen. Faz doze anos que assisti ao primeiro filme da saga nos cinemas, na companhia da minha irmã caçula, ela, ainda uma adolescente, eu saindo dessa fase da vida. Deixei a sessão completamente hipnotizada pelo enredo e principalmente pelo Edward do Robert Pattinson. Comprei o primeiro livro logo em seguida, já emendando com Lua Nova (2008), que também já havia sido publicado aqui no Brasil, e fiquei mais hipnotizada ainda. Quando a sequência chegou às telonas em 2009, eu já havia devorado Eclipse (2009) e Amanhecer (2009) também.

Vi o trio principal da saga composto por Pattinson, Kristen Stewart e Taylor Lautner ser alçado ao estrelato, acompanhei o crescente sucesso se tornar um fenômeno e dediquei minha Tese de Conclusão de Curso na faculdade a Crepúsculo.

Que vergonha própria eu sinto de mim mesma, mesmo entendendo que coisas desse tipo acontecem, fazem parte da vida e do próprio processo de amadurecimento. Tudo bem que, no meu caso, esse amadurecimento veio um pouquinho mais tarde, já que aos vinte anos de idade, a saga de Meyer já não deveria ter me impactado tanto. Não deveria, mas assim aconteceu. É claro que, tendo alcançado o tamanho que alcançou, Crepúsculo foi alvo do estudo de vários estudiosos da literatura e do cinema, que buscavam entender o motivo do frisson coletivo que o romance causou. Um deles foi Nicola Bardola, que depois de muita pesquisa, escreveu o livro Almanaque Crepúsculo (2010). Em sua obra, ele chegou à várias conclusões interessantes, mas como os outros, era apenas um estudioso, Crepúsculo sendo apenas mais um objeto de estudo interessante. Já eu amava por amar.

Quanto aos livros em si, porém, não me martirizo tanto. Existem histórias que são feitas para certo tipo de público e devem ser analisadas sob essa ótica. É preciso saber reconhecer, por exemplo, quando um livro infantil é bom mesmo que nós, adultos não sejamos mais os consumidores desse tipo de produto. É preciso reconhecer que determinado livro é voltado para as mulheres, mesmo que alguns homens os leiam para saber porque elas gostam tanto daquilo. E assim por diante. Seguindo essa linha de raciocínio, no prefácio de seu livro Bardola diz que “[…] Alguns críticos, cuja avaliação costumo respeitar, consideram a saga vampiresca horripilante, melosa, entediante, brega ou casta,” [risos!] “e o final, mal concebido”, o que considero um exagero por parte de pessoas que desprezaram a obra. É normal. Crítico é crítico, e falo por experiência própria! De minha parte, porém, entendo que Crepúsculo (em sua versão literária), pode até ser meloso e casto e beirar o brega, mas isso não o torna entediante e muito menos horripilante. Muito pelo contrário, é uma história bastante envolvente que capta o leitor e o mantém na leitura mesmo que seja para saber aonde aquela melação toda vai chegar, e se você não gosta é porque simplesmente não é o público e/ou não tem nenhum outro interesse por trás.

É preciso reconhecer que Meyer não tem o nível de JK Rowling, mas escreve bem.

Os mesmo críticos mencionados por Bardola “também citam uma engenhosa estratégia de marketing, baseada em larga medida na internet. Dessa maneira, seu sucesso se deveria principalmente às redes sociais da internet.” Não vejo nenhum demérito nisso. O famoso Bruxas de Blair (Daniel Myrick, Eduardo Sánchez, 1999), considerado um clássico do terror e que pessoalmente não me agrada, também é puro marketing e ninguém reclamou tanto. Crepúsculo é um produto da indústria cultural e não há problema nenhum nisso.

Quanto à versão da saga para o cinema, porém, a conversa é outra.

O tempo passou e, hoje, vários anos e muitos filmes mais tarde e tendo apurado meu entendimento cinematográfico através de estudos e observação, vejo como os longas de Crepúsculo são ruins (para dizer o mínimo). Parece ter havido um ódio coletivo de Hollywood pelo romance e, diretor após diretor (porque cada filme da saga é dirigido por uma pessoa diferente) foi estragando a história de Bella Swan e Edward Cullen. Assim, Catherine Hardwicke começou com o serviço mal feito, passando por Chris Weitz, David Slade e Bill Condon fechou o trabalho com chave de latão.

Meu Jesus, que filmes terríveis!

Claro que não quero dizer aqui que acho que tenha sido uma tarefa fácil adaptar uma história tão introspectiva quanto Crepúsculo. Boa parte do enredo acontece dentro da cabeça dos personagens, o que é muito difícil de exteriorizar e quando se trata de um romance, o risco de ficar piegas é enorme… Nada, no entanto justifica aquelas perucas horrorosas e a maquiagem medonha que são uma marca dos longas. Em relação a isso, Taylor Lautner foi o que mais sofreu, tendo que ostentar madeixas inacreditáveis durante Crepúsculo e Lua Nova. Deve ter sido um alívio pra ele quando seu personagem apareceu com o cabelo aparado em Eclipse.

Já quanto aos vampiros… Antes figuras sedutoras, na tela eles viraram bonecos de cera sem expressão que quebram e trincam como porcelana, em total oposição ao diamante (o material mais duro da natureza) que os livros sempre repetem ser o elemento mais parecido com a composição de sua pele. A maquiagem é tão bizarra que dá medo, e é por isso que todos os filmes deveriam ganhar o prêmio Framboesa nessa categoria. Por outro lado, o fato de eles brilharem não me incomodou, porque o livro é claro em dizer que isso acontecia mesmo. Meyer ressignificou os vampiros, trocando a característica secular que eles possuem de queimar ao sol pela de refletirem a luz. Estava, assim, em seu total direito de liberdade criativa. Mas nada explica aquela maquiagem que, ao invés de ressaltar a beleza dos atores (e a ideia era essa!), surtiu o efeito contrário.

A forma cinematográfica (principalmente do primeiro filme) é outro ponto que decepciona. Filmado quase totalmente em close-up e em ângulos bastante fechados, o longa causa uma sensação de claustrofobia absurda que não funciona. Aliás, praticamente nada, a não ser a trilha sonora, funciona. Crepúsculo não é experimental, não traz nada de novo em questões cinematográficas e não consegue impor nenhuma pretensão de ser uma grande obra. Aqui eu concordo que a história se torna entediante e meio parada – tirando a o último ato do último filme, Amanhecer, Parte 2 (2009), que apresenta uma luta bastante interessante entre vampiros e lobisomens.

Mais ainda, em meio a atuações bem medianas, só dois atores se salvam: Robert Pattinson (Edward) e Ashley Greene (Alice). Taylor Lautner só se garante em seus tanquinhos e Anna Kendrick (que na época ainda não era ninguém), aparece pouco demais para podermos fazer qualquer avaliação melhor.

A conclusão é óbvia. Quando uma história sai da literatura para o cinema, ganha um novo autor: o diretor, alguém que, dentro do roteiro, vai reescrevê-la sob seu próprio ponto de vista. A saga Crepúsculo teve quatro autores e todos falharam em retratar no audiovisual a obra na qual se basearam e que é sim bastante legal para o público a que se destina. Os livros de Stephenie Meyer ficarão gravados com carinho na lembrança do início da minha juventude. Os filmes, por outro lado, não merecem mais nenhuma consideração.

Crepúsculo é um Blockbuster sim. Grande obra jamais.

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